“Aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado pelo falecido deverá pagar aos demais herdeiros valores a título de aluguel proporcional, quando demonstrada oposição à sua ocupação exclusiva” – a lição é do STJ.
UMA SITUAÇÃO MUITO COMUM em questões relacionadas a inventário diz respeito ao uso exclusivo por quaisquer dos herdeiros quanto a determinado bem componente do espólio/herança. A situação se agrava ainda mais quando embebido pelo tempo que pode levar a resolução de um Inventário – isso quando aberto/iniciado, já que muitos casos nem iniciados foram ainda – a “posse exclusiva” do bem por parte daquele herdeiro se protrai indefinidamente no tempo.
Como costumeiramente tratamos aqui, a questão é perigosa pois o estabelecimento da POSSE por determinado TEMPO sobre COISA suscetível pode permitir o reconhecimento do direito à USUCAPIÃO em favor do herdeiro que ocupa com exclusividade e já não é novidade alguma nem para doutrina nem para a jurisprudência a possibilidade de usucapião sobre bens de herança (a título de exemplo confira-se REsp 1631859/SP). É muito comum infelizmente que muitas famílias não resolvam desde logo o Inventário e a Partilha dos bens oriundos de herança por conta do falecimento do titular. O uso exclusivo de bem componente da herança por algum dos herdeiros com exclusividade é passível de arbitramento de aluguel a ser fixado judicialmente caso essa fixação não se dê amigável e voluntariamente entre os envolvidos (o que raramente vai acontecer, inclusive), como confirma a doutrina dos ilustres FARIAS e ROSENVALD (Curso de Direito Civil. 2023):
“Pois bem, considerando que a transmissão automática de saisine (CC, art. 1.784) estabeleceu um condomínio e uma composse entre todos os coerdeiros e legatários, é CERTO E INCONTROVERSO que, se um deles estabelecer um CONTATO EXCLUSIVO com a coisa, colhendo frutos e exercendo ATOS DE POSSE, há de indenizar os demais, sob pena de violação do fundamento central do condomínio, conforme precisa assertiva do art. 1.314 do Código Reale. Dessa maneira, quem exercer posse de um bem integrante do espólio precisa compensar os demais, a partir da data da abertura da sucessão (= morte), quando se formou, automaticamente, o condomínio, sob pena de enriquecimento sem causa, vedado pelo sistema jurídico ( CC, arts. 884-886). Trata-se de uma ESPÉCIE DE” ALUGUEL “PROPORCIONAL, compensando os demais coerdeiros pelo uso da coisa, porém abatendo os valores correspondentes às despesas intrínsecas ao bem, como o imposto predial e os custos de manutenção”.
A questão é extremamente relevante pois, cediço que até que haja efetivamente PARTILHA resolvendo os bens deixados pelo morto não há que se falar em titularidade por quaisquer dos herdeiros sobre os bens, até mesmo porque, como sabemos, prioritariamente o acervo deve responder e liquidar as dívidas deixadas pelo defunto (art. 1.997) só havendo se falar em distribuição de bens aos herdeiros como a Lei autoriza somente no caso de sobrarem bens.
Importa anotar que até que se efetivamente manifeste OPOSIÇÃO à ocupação estabelecida com a constituição do “devedor” em mora (o que poderá ser feito através de uma NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL viabilizada através do Cartório de Títulos e Documentos – art. 160 da Lei de Registros Públicos) não se pode considerar iniciado o termo inicial para a cobrança dos alugueis proporcionais. Assim já se manifestou há tempos o STJ:
“STJ. REsp: 570723/RJ. J. em: 27/03/2007. Direito civil. Recurso especial. Cobrança de aluguel. Herdeiros. Utilização exclusiva do imóvel. Oposição necessária. Termo inicial. – Aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado pelo falecido deverá pagar aos demais herdeiros valores a título de aluguel proporcional, quando demonstrada oposição à sua ocupação exclusiva. – Nesta hipótese, o termo inicial para o pagamento dos valores deve coincidir com a efetiva oposição, judicial ou extrajudicial, dos demais herdeiros. Recurso especial parcialmente conhecido e provido”.
Cabe por fim ressaltar que é IRRELEVANTE o fato de o Inventário ter sido ou não aberto – e mesmo pendente a homologação da partilha judicial como aponta com acerto decisão recente do TJAM que, amparada em precedente do STJ reformou a sentença do juízo de piso que, sem acerto extinguia o feito sem a resolução do mérito:
“TJAM. 0735255-55.2021.8.04.0001. J. em: 13/05/2024. APELAÇÃO CÍVEL. FIXAÇÃO DE ALUGUEL CORRESPONDENTE À COTA PARTE DE CADA HERDEIRO. BEM DE HERANÇA. PENDÊNCIA DE INVENTÁRIO. INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE. ART. 612 DO CPC E ARTS. 1784 E 1791, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CC. PRECEDENTES. HERDEIRA QUE OCUPA IMÓVEL COMUM COM EXCLUSIVIDADE. PAGAMENTO DE ALUGUEL DEVIDO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. Herdeiros têm interesse processual para pleitear, em ação própria, indenização por uso exclusivo de imóvel comum, mesmo antes do término de inventário de bens; Não havendo concordância, o uso do imóvel somente será possível mediante o pagamento de valores decorrente de ocupação exclusiva aos herdeiros eventualmente privados da utilização do bem, nos termos dos artigos 1.319 e seguinte do Código Civil; Aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado por pessoa falecida DEVERÁ PAGAR AOS DEMAIS HERDEIROS VALORES A TÍTULO DE ALUGUEL PROPORCIONAL, a partir da efetiva oposição, extrajudicial ou judicial, à ocupação exclusiva. (STJ, REsp 570.723/RJ, Relª. Minª. Nancy Andrighi); Todos os herdeiros fazem jus à percepção dos frutos dos bens do espólio. Assim, ainda que pendente a homologação da partilha judicial, revela-se acertada a decisão que arbitra o aluguel a cargo do herdeiro que ocupa o bem com exclusividade, em valor correspondente a cota parte de cada um dos herdeiros demandantes, sob pena de não obterem a contento e integralmente os frutos que lhes são devidos; Alugueis a serem apurados em liquidação de sentença, sendo devidos desde a notificação extrajudicial com oposição expressa ao uso exclusivo Recurso Conhecido e Provido”. Fonte: Jornal Jurid